São Paulo – Depois que investigações descobriram um sistema nos carros da Volkswagen que alterada os resultados de testes de emissões de gases poluentes, a montadora mergulhou em uma crise mundial.
A fraude envolve cerca de 11 milhões de carros movidos a diesel em todo o mundo, o que obrigou a empresa a fazer recalls e a pagar multas bilionárias.
Os custos podem ser ainda maiores, já que há diversos processos que ainda estão correndo. Além disso, um ano após o escândalo ser descoberto, nove em cada dez motoristas ainda estão esperando o recall ou conserto do seu veículo.
A companhia ainda irá levar vários anos para se recuperar, afirmou Ferdinand Dudenhoeffer, especialista no mercado automotivo e diretor do Centro de Pesquisa Automotiva da universidade de Duisburg-Essen da Alemanha.
O que não irá se recuperar é o motor a diesel, disse ele em entrevista a Exame.com. Confira a entrevista na íntegra abaixo.
O grupo europeu é dono de 12 marcas como Audi, Porsche, Skoda e Seat e tem 610.000 funcionários em todo o mundo.
O escândalo explodiu em 18 de setembro de 2015, quando a montadora admitiu ter instalado um sistema que adulterava os motores para falsificar o nível de emissões poluentes. O software, que funcionava desde 2008, é capaz de saber quando o carro está sendo avaliado e ativa um mecanismo para emitir menos gases poluentes.
Para pagar pelos recalls e processos, a empresa fez provisões de US$ 18,2 bilhões. Essas despesas e a queda de 2% nas vendas globais levaram a empresa, no ano passado, a seu primeiro prejuízo anual em mais de 20 anos.
O caso impactou profundamente as ações da empresa e os dividendos que ela paga aos acionistas. O presidente foi demitido e substituído por Matthias Müller, que desenvolveu uma boa estratégia a longo prazo, afirmou Dudenhoeffer.
A sua maior multa foi aplicada nos Estados Unidos. Uma ação coletiva movida representou donos de 480.000 veículos e conseguiu compensações de US$ 15 bilhões. A empresa ainda enfrenta processos na Austrália, Coreia do Sul, Alemanha e Itália.
No Brasil, a Associação Brasileira de Defesa do Consumidor e Trabalhador (Abradecont), que entrou com uma ação civil pública contra a empresa, para exigir indenização moral e material.
Cerca de 17.000 carros do modelo Amarok foram vendidos entre os anos de 2011 e 2012, segundo o advogado LEONARDO AMARANTE, representante da associação. A ação foi aberta em setembro do ano passado, logo depois que o escândalo foi divulgado.
A Volkswagen afirmou que realizou diversos testes nos automóveis brasileiros e constatou que o sistema fraudulento não estava ativo nos modelos Amarok vendidos no Brasil. No entanto, realizará o recall da mesma forma.
Na Alemanha, um grupo de investidores pediu 8,2 bilhões de euros ao grupo Volkswagen por causa do escândalo dos motores a diesel. No total, 1.400 denúncias foram apresentadas, a maioria de investidores privados.
Confira abaixo a entrevista dada por Ferdinand Dudenhoeffer, especialista no mercado automotivo, a Exame.com.
EXAME.com – Um ano depois que a fraude se tornou pública, A Volkswagen fez o suficiente para resolver a crise?
Ferdinand Dudenhoeffer – Sim e não. Veja, o novo CEO Matthias Müller começou a criar uma nova cultura, tomou tempo para resolver os problemas legais e desenvolveu uma nova estratégia de longo prazo para o grupo. Na minha visão, ele fez um bom trabalho. Ele não pôde resolver todos os problemas, mas sua abordagem foi apropriada para a profunda crise da empresa.
No entanto, alguns comentários sobre o “não”. Um dos comitês mais importantes dentro do grupo, o conselho de supervisão. É estranho que o antigo diretor financeiro tenha se tornado o chairman desse conselho. Isso contrasta com as regras de governança corporativa da empresa.
Um dos principais motivos para as ações ilegais foi sua posição competitiva em relação a custo. Esse problema continuará no futuro e a estrutura organizacional da Volkswagen ainda é uma razão para possíveis problemas no futuro.
EXAME.com – Quais foram os principais impactos do escândalo para a companhia?
Dudenhoeffer – O resultado mais importante é que, por conta do Dieselgate, os motores a diesel não terão futuro. A indústria automotora europeia acumulou custos muito altos por conta dessa questão. Por isso, as montadoras são pressionadas a acelerarem o mercado de carros elétricos.
EXAME.com – Em relação à multa de US$ 15 bilhões que a empresa terá que pagar nos Estados Unidos, o senhor acredita que é o suficiente para reparar os danos aos consumidores e ao meio ambiente?
Dudenhoeffer – Se olharmos para os Estados Unidos, acho que eles pagaram um bom dinheiro – US$ 15 bilhões para 480.000 carros. Portanto, acho que eles chegaram a um valor justo.
Nos outros países, há alguns processos pendentes e investidores abriram reclamações pedindo ressarcimento. Além disso, as marcas também precisam resolver problemas com motores a diesel em outros milhares de carros. Isso poderá resultar em custos de dezenas de bilhões de dólares.
EXAME.com – A Volkswagen tem sido criticada por tratar os consumidores de outros lugares do mundo, como os europeus, de forma diferente do tratamento dado aos norte-americanos. O senhor concorda?
Dudenhoeffer – Isso acontece porque temos leis ruins para proteger os consumidores na Alemanha e em outros países. Mas a Volks não é responsável pelas leis e ela tem o direito de seguir as leis. Temos que questionar os nossos políticos em relação a essas políticas de proteção ao consumidor.
EXAME.com – O senhor acredita que a companhia pode recuperar suas finanças e a confiança dos consumidores?
Dudenhoeffer – Nos próximos anos, a Volkswagen terá grandes dificuldades. No entanto, no longo prazo eles irão se recuperar e, com essa nova estratégia, as portas estão abertas para ela voltar a ser um player importante na autoindústria.
Fonte: Site Exame.com